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segunda-feira, 4 de março de 2013

Sobre ligações da vovó

– Alô?
– Alô, filhinha? – é aquela voz, velha conhecida minha, a mesma que anunciava bolos e brigadeiro na infância.

Com uma pontada, eu percebo que não falo com ela há algumas semanas. Que triste. Costumávamos ser confidentes, cada mínimo detalhe da escola contado como se fosse uma aventura, respondido com uma peripécia de meu avô, por horas a fio.
– Oi, vó. Tudo bem com você? – eu queria que ela perguntasse porque é que a gente parou de se falar tanto quanto antes.
– Aqui tá tudo bem, sim. E com vocês? – odeio esse plural. Queria que ela perguntasse como eu estou. Queria mesmo. Porque não estou bem, estou com muita saudade.
– Tudo bem. E o vovô? – eu queria que ele pedisse para falar comigo. 
– Ele tá bem. E o namorado? (risos) – não sei por que ela sempre ri quando fala do Felipe. Acho que é vergonha, sei lá. Tenho inveja dele, que tem os avós tão perto de casa. Meus avós moram a quase trezentos quilômetros de mim. Acho que a distância vai apagando as coisas.
– Ele tá bem, também. mandou um abraço (risos). – nem sempre ele mandou.

Pausa chata. Eu escuto a respiração dela. Ao longe, os cachorros latem para algum carro da rua. Uma bicicleta buzina. Deve ser o padeiro. Minha avó mora numa cidade onde os padeiros ainda andam de bicicleta. Ou serão os sorveteiros?

– Tá calor aí, né? Sua mãe me disse que está. – ela retoma o papo. Eu queria que ela me contasse como foi seu dia e se ainda está fazendo aulas de informática.
– Sim, tá calor demais! Parece até que estou aí! – a cidade dela é mesmo muito quente. Lembro-me de tomar banho de mangueira quando o calor estava insuportável. Depois, minha avó me mandava direto pro banho, porque meus pés ficavam pretos da fuligem que caía da Siderúrgica Nacional. –... vó, eu vou ver você nas férias, viu?
– Ah, filha, vem sim! A vovó tem tanta saudade de você!
Outra pausa. Dessa vez, escuto o Jornal Nacional começando. Tenho inveja da minha mãe, que consegue conversar com a vovó por meia hora sem parar nem gritar que está com saudade.
– Bom, manda um beijão pra todo mundo aí. – espero que ela mande mesmo. Porque eu vou mandar o beijo que ela vai pedir pra eu mandar.
– Outro, filha! Outro. Tchau!
– Vó? Eu te amo!

Mas a linha já está muda. Do outro lado, só o TUTUTU me responde.

4 comentários:

  1. Um pouco triste, mas é um texto muito bonito :3

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  2. Obrigada, Isa! É triste mesmo... queria passar como me sinto, sabe? :)

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  3. sua sinceridade que cê transforma em palavra e prosa, além de me inspirar depois de uma calmaria braba, me faz te admirar ainda mais. é muito bom te (re)conhecer nos seus textos, Helô. Mesmo que a gente num esteja tanto nos dias uma da outra,me sinto entrando em você, te conhecendo mais. e é linda essa sinceridade que você lida com si mesma e acaba oferecendo pra gente um pouco do que você é. e é lindo ver como você transforma algo tão seu e tão íntimo em texto. é um prazer te ver por meio de um texto. de uma amiga perdida, que bota fé em você e no que você se converte por meio da palavra
    Mavi.

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  4. Mavi, querida, seu comentário é um amor em forma de texto. Muito obrigada pelo carinho, fico feliz de te fazer sentir assim tão perto de mim! :)

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